Translate

sábado, 23 de abril de 2011

Eco distante

Eu ainda posso escuta-lo. Agudo e breve, um tanto quanto chamativo e cruel. Meu chamado constante de volta a minha consciência perdida, de volta a minha mente doentia e crônica. Um pouco de dor, alguns mililitros de drama e uma fatia de solidão. Tudo que eu preciso para voltar a mim mesma, para estar com a consciência vivida novamente.

Preciso de uma bíblia e de alguns livros que me remetam a questionamentos que façam o mínimo de sentido. Quero meus lápis e meus cadernos. Um pouco do outono.

Apenas alguns dias para esquecer da imensa perdição de mim. Alguns instantes para que eu possa recobrar o que perdi, o que deixei escorrer de dentro da minha alma. Aquelas partes luminosas que tanto me faziam companhia e agora somem pra dar espaço a um entretenimento mais humano, com um calor agudo e fraterno que de nada tem a ver comigo.

Não costumo ser chamativa ou realista demais. Ainda prefiro o mistério, a discrição e as utopias distantes. Quero ter um pouco de altruísmo, mas assassina-lo com meu bom senso frio e calculista.

Não, na verdade não quero nada disso.

Prefiro a quentura dos livros ou o incomodo do inverno. Não do inverno físico. Mas daquele de dentro, a neve fria, carrasco da alma, rainha do medo. Quero ter a bondade de sentir a falta, mas também a sanidade de não lembrar.

Sonhar com anjos perdidos que assolam a noite em busca de justiça. Assassinar antigos monstros que me incomodam por diversão. Tornar-me austera, introspectiva, vivaz. Uma visão contraditória, talvez. Mas eu nunca gostei de coisas obvias e não procuro por isso.

Tenho dificuldades em tornar-me cética. Mas odeio o quanto sou fria. Um coração de gelo, uma alma pesada. Palavras arcaicas, expressões vazias. Nos pulmões, o ar pesado e úmido. Nos olhos, a água parada, uma seca sem fim. A pele áspera. Não desejo isso pra ninguém. A não ser, pra mim.

A ultima badalada dos sinos da igreja soam ao anoitecer. Crepúsculo do dia, transição de fases. Luminosidade e então, escuridão.

Parece finalmente fazer sentido.

Sempre fez.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

quarta-feira, 20 de abril de 2011

How to save a life - The Fray

Hoje, enquanto voltava pra casa dentro do meu querido ónibus lotado, ao som de um pagode irritante, tive a brilhante ideia de me prender em meu proprio mundo no momento em que coloquei os fones de ouvido e deixei meu iphone no aleatório em uma lista que eu fiz com minhas musicas favoritas.
Como minha casa fica um tanto quanto distante do centro (45 minutos de viagem, quando o motorista esta de bom humor), eu pude ouvir 30 dentre as 99 musicas favoritas. Foi então, que no meio do caminho, pega de surpresa, a musica "how to save a life" começa a tocar, dizendo coisas que fizeram certas duvidas renascerem dentro de mim. Algumas pontas afiadas foram me cortando por dentro, como facas de alumínio que estivessem no meu estômago.
Uma vez, eu li essa letra e lembrei de um amigo meu que eu tinha supostamente perdido e estava com medo que não tivesse acrescentado nada na sua existência. Felizmente, foi apenas uma fase e tudo se resolveu.
Mas hoje, eu relacionei essa musica a dois amigos, os quais eu tenho muito medo de não ter conseguido salvar.
Na verdade, eu tenho medo de perder um desses amigos e não poder ajudar no seu auto-conhecimento(algo que eu venho tentando há um bom tempo).
Mas quanto ao outro, a situação se complica um pouquinho mais. Creio que a essa altura, eu já o tenha perdido e por isso me assusta tanto.
Não sei se todos os meus pedidos serão atendidos ou se as promessas serão cumpridas e isso alimenta minha preocupação. Não sei se algumas discussões exageradas fizeram qualquer espécie mínima de efeito.

Por todas essas razoes, eu tive uma quase epifania dentro do ónibus e na verdade ainda estava tendo ate uns poucos minutos atrás.

Sem achar um método mais simples e eficaz, eu resolvi por seguir o que a própria musica diz: Orar a Deus para que ambos me ouçam.

"And pray to God he hears you"

sábado, 9 de abril de 2011

Uma pequena previa

"[...]O que diabos eu estava fazendo aqui, nesse maldito vestido vermelho? Não, não poderia ser verdade... Eu estava...

Sozinha.

Eu e minha estaca.

E aquele ser, aquele vampiro arrogante e egoísta, estava com seu grupo irritante de amigos sobrenaturais.

Sem mais honras ou cerimônias, Morgan, incrivelmente rápido, atacou uma das garotas que ele trazia presa a seu trono. Numa fração de segundos eu vi o sangue da inocente jorrando e o forte aroma que incendiava o desejo dos vampiros ao meu redor.

E o mais assustador: O forte desejo que havia incendiado em mim."

- Isadora Betterwest, A cura

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Pesada

Ano passado muitas pessoas me diziam que aquela seria a época mais difícil da minha vida. Eu discordo totalmente. Estar em um momento onde o vestibular é o pior medo da sua vida não é nada, nada comparado ao que tem acontecido ultimamente.
Não é nada fácil ver uma pessoa que é tão importante pra mim estar deitada em uma cama de hospital, correndo risco de vida. E o pior de tudo: o fato de que ha muito pouco que se possa fazer para mudar isso.

Talvez seja obra do destino, talvez tudo isso tenha que acontecer para o crescimento de todos que nos afetamos por isso. Mas eu não posso negar que, ultimamente, muitos acontecimentos "fortes" tem aparecido. Em menos de um mês, eu me deparei com um homem que, ao que tudo indica, era traficante de drogas e de armas; eu tive que me acostumar ao mundo da universidade onde é cada um por si e Deus por todos; eu tive que ver minha melhor amiga em um estado de risco e no meio disso tudo, tentar manter a esperança e o bom humor.

Mas, apesar de ter acabado de afirmar que eu tento manter o bom humor, isso não é verdade. Normalmente eu costumo me deixar cair em questão de segundos, pensando em todas as possibilidades pessimistas e possivelmente aceitando e xingando o destino que tanto tenta me vencer. Bem, eu disse que isso acontece normalmente. Mas não dessa vez. Por que, seja por sorte, seja por alguma obra divina, eu tenho uma espécie de estimulante que não permite que eu caia tão facilmente. Eu tenho algo que me faz perceber que pra que eu possa fazer e trazer o bem, eu preciso estar bem.

Eu tenho tu.

E isso é uma coisa com a qual eu ainda tenho de me acostumar.

Tu olha pra mim, com aquela expressão de preocupação suprema, dizendo coisas que eu sei que devo fazer mas me nego pelo fato de querer ter uma automutilação digna dos dramas de Shakeaspeare: "Tu precisa se alimentar, tu precisa dormir, tu precisa descansar, tu precisa estudar, tu precisa ficar bem, vai dar tudo certo, tu vai ver como tudo vai acabar bem, eu vou estar aqui por ti... Como tu vai poder ajuda-la se ficar mal? Como as coisas vão dar certo se tu não acreditar?"

Bla, bla ,bla.

Eu odeio isso. Eu odeio ficar bem e ter um pouco mais de esperança. Eu sinto falta de quando tinha que me auto aconselhar e confortar, suportando a dor sozinha. Agora tu simplesmente aparece e faz com que isso seja mais suportável. E eu odeio isso. Odeio o poder que tu tem de tocar na minha vida e fazer com que tudo melhore.
O pior de tudo, é que essa não é a primeira vez que tu aparece pra me socorrer. Tu sempre aparece. Ate quando eu não quero, quando eu não chamo.Principalmente quando eu não chamo.

A tristeza que invade meus pensamentos, o medo de perder alguém que eu tanto amo, a dor de ver o sofrimento dos meus amigos... Isso pesa tanto dentro de mim, me faz ficar tão angustiada, tão assustada com a fatalidade que nos cerca. Parece que eu não vou ser forte o suficiente pra aguentar, pra ficar aqui. Talvez eu esteja fazendo drama, mas é que so de pensar na dor de alguém que eu amo, faz com que eu sofra em dobro o que sofreria se fosse comigo mesma. Antes eu, do que qualquer outra pessoa importante pra mim. Mas tu me incentiva a continuar persistindo. Tu me faz querer ficar de pe, quando o normal seria que eu caísse. Tu me da energia, quando tudo parece desabar. E eu te devo tanto por isso...

Eu caio, mas caio nos teus braços e tudo fica mais fácil. Eu me torno extremamente dependente e vulnerável. Me deixo ficar ali pelas horas intermináveis e injustamente rápidas, tentando absorver o Maximo de todo esse apoio. E eu me sinto pesada, mas ao mesmo tempo, leve. Me sinto triste, mas ao mesmo tempo, reconfortada.

Se houvesse uma palavra que exprimisse o quanto eu sou grata por tu estar ali por mim, pode ter certeza que eu a diria repetidas vezes, mas infelizmente ela ainda não foi inventada. Então tu vai ter que se contentar em ouvir um tímido "Obrigada" ou um repetido "Eu te amo", por que são ditas de verdade.

Obrigada.

Save you - Simple Plan

"[...]Às vezes eu queria poder te salvar e tem tantas coisas que eu quero que você saiba, eu não vou desistir até o fim. Se isso te levar pra sempre, eu quero que você saiba que se você cair ou tropeçar eu te levantarei do chão, se você perder fé em você, eu te darei força pra sair dessa.
Me fale que você não vai desistir porque eu estarei esperando. Se você cair, você sabe: eu estarei lá por você
Se ao menos eu pudesse encontrar a resposta pra fazer isso ir embora..."

Eu queria poder te salvar.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Eu seria...

Se eu fosse um mês, eu seria: Outubro
Se eu fosse um dia da semana: Quarta
Se eu fosse uma hora do dia: 19:00
Se eu fosse um planeta ou astro: Lua
Se eu fosse uma direção: Norte
Se eu fosse um móvel: Sofá
Se eu fosse um líquido: Água
Se eu fosse um pecado: Ira
Se eu fosse uma pedra: Safira
Se eu fosse uma árvore: Pinheiro
Se eu fosse uma fruta: Melancia
Se eu fosse uma flor: Dama da noite
Se eu fosse um clima: Temperado
Se eu fosse um instrumento musical: Baixo
Se eu fosse um elemento: Ar
Se eu fosse uma cor: Preto
Se eu fosse um bicho: Gato
Se eu fosse um som: Do vento ou do trovão
Se eu fosse uma música: Merry me Bella - Alexandre Desplat
Se eu fosse um estilo musical: Rock
Se eu fosse um sentimento: Ansiedade
Se eu fosse um livro: O vendedor de sonhos
Se eu fosse uma comida: Pastel integral de brócolis
Se eu fosse um lugar: Biblioteca central da puc (ou de Hogwarts)
Se eu fosse um gosto: Doce
Se eu fosse um cheiro: Petit
Se eu fosse uma palavra: Determinação
Se eu fosse um verbo: Lutar
Se eu fosse um objeto: Um livro
Se eu fosse uma parte do corpo: Olhos
Se eu fosse uma expressão facial: Emocionada (vide: *-*)
Se eu fosse um desenho animado: Tom e Jerry
Se eu fosse um filme: Homem-Aranha
Se eu fosse um número: 7
Se eu fosse uma estação: Outono

Nostalgia


"Sempre me disseram que se deve ser feliz de dentro pra fora. Pois se é assim, então eu não sou. Eu guardo sentimentos ocultos. Eu guardo melancolia. Eu alimento minhas nostalgia.

E em dias como hoje, desenterro todo o meu passado e brinco de voltar no tempo com as palavras. De mudar o que já acabou. De eternizar o que nem durou.

Talvez a vida seja mesmo isso. Guardar sentimentos.

Eu só não consigo entender como as pessoas conseguem com o tempo, simplesmente se desfazer de tudo isso. O tempo pra mim, não muda nada: Deixar as coisas mais distantes só faz com que a minha vontade de alcançá-las aumente.

Sinto saudade de tudo aquilo que já passou. De todos os cheiros, de todos os erros e de todos os medos. Dos amigos que se foram. Dos idiotas que me fizeram aprender o que é sofrer.

Sinto falta de caber no banco de trás do carro dos meus pais. Do meu primeiro colégio e das suas exigências sem fundamento. Da minha professora do infantil que me faz acreditar que eu era diferente.

Sinto falta de tudo aquilo que tive que deixar, de tudo aquilo que me deixou antes mesmo de chegar. Dos abraços e das lágrimas que eu não deixei cair. Da cor do meu quarto quando o sol batia pela janela. Da música que tocava naquela viagem de família.

Mesmo sabendo o final da história, eu não faria diferente. Eu faria de novo. Pra sempre."

Créditos: Bruna Vieira - www.depoisdosquinze.com

Uma gota de reflexão

"Um homem tinha quatro filhos.

Ele queria que seus filhos aprendessem a não ter pressa quando fizessem seus julgamentos.

Por isso, convidou cada um deles para fazer uma viagem e observar uma pereira plantada num local distante.

O primeiro filho chegou lá no INVERNO,
o segundo na PRIMAVERA,
o terceiro, no VERÃO
e o quarto, o caçula, no OUTONO.

Quando eles retornaram, o pai os reuniu e pediu que contassem o que tinham visto.
O primeiro chegou lá no INVERNO.
Disse que a árvore era feia e acrescentou:
“- Além de feia, ela é seca e retorcida!”




O segundo chegou lá na PRIMAVERA.
Disse que aquilo não era verdade.
Contou que encontrou uma árvore cheia de botões, e carregada de promessas.

O terceiro chegou no VERÃO.Disse que estava graciosa como ele jamais tinha visto.


O último filho chegou no OUTONO.
Ele disse que a árvore estava carregada e arqueada cheia de frutas, vida e promessas…

O pai então explicou a seus filhos que todos eles estavam certos, porque eles haviam visto apenas uma estação da vida da árvore…

Ele disse que não se pode julgar uma árvore, ou uma pessoa, por apenas uma estação.

A essência do que se é, (como o prazer, a alegria e o amor que vem da vida) só pode ser constatada no final de tudo, exatamente como no momento em que todas as estações do ano se completam!


Se alguém desistir no INVERNO, perderá as promessas da PRIMAVERA, a beleza do VERÃO e a expectativa do OUTONO."

- Autor Desconhecido

terça-feira, 5 de abril de 2011

No Inferno, todos vestem roupas brancas

[...]"Ao que consta, leões não têm a capacidade de raciocínio semelhante a um humano. Eles não podem fazer escolhas, simplesmente porque não têm como refletir sobre as consequências dos próprios atos. Leões não planejam estrategicamente como irão matar suas presas a fim de terem lucro com isso, e tampouco consideram normal a condição de degradação de outros seres de sua própria espécie em prol da satisfação do luxo de outros poucos. Apenas o ser humano é capaz de ter estratégias para a exploração máxima de todos aqueles capazes de sofrer sem de fato considerar isso. Hoje, muito se fala sobre bem-estar animal, porém trata-se apenas de um modo mais refinado de justificar injustificáveis fins.

O bem-estar animal agrada a muitos, pois consegue suavizar o sofrimento e a culpa daqueles que sustentam a indústria da morte, e ajudam a aumentar os lucros através de medidas que teoricamente são adotadas para beneficiar os animais, mas que são norteadas pelo aumento da produtividade e qualidade do produto final. O limite do ‘bem-estar animal’ vai até onde o marketing e o lucro podem vislumbrar. É inacreditável que, para a grande maioria, ingenuamente, esse ainda seja visto como o caminho para o fim do sofrimento. O sofrimento animal apenas poderá ser reduzido quando criarmos coragem para defender o direito dos animais, através da abolição do consumo de seus corpos para a satisfação fugaz de nossos desejos egoístas."

Escrito por: Denise Terra - Formanda em Medicina Veterinária

Fonte: Vanguarda Abolicionista

segunda-feira, 4 de abril de 2011

A carta - Pt. 3

Querida Jane, eu preciso contar-lhe algo que há muito tem tirado o sono de minhas pálpebras e agitado os pensamentos que me vem à mente. Eu estou no futuro, de novo.
Oh minha querida amiga, por favor, não me julgue ao ler tal revelação. Temo que seu temperamento forte acabe por deixar-lhe os nervos transtornados, mas não deixemos que tal adivinhação de minha parte venha a se realizar. Antes de pensar em censurar meus atos, tente compreender seus motivos.
Pois bem, estava eu a ler alguns contos juvenis, quando de repente algo furtivo e um tanto que irresponsavel atravessara minha sensatez e furtara meu bom-senso: A maquina do tempo que papai guardava no porão ainda estava intacta. O que aconteceu depois desse ímpeto nada plausível de frivolidade e paixão, creio que não seja necessario que se descreva. Eu a usei. Mas juro-lhe, com todas as forças da imensa estima que tenho por voce, que jamais me ocorrerá tamanho equivoco. Nao pretendo entrar naquele antro de perdição, por muito tempo, quiçá pela vida toda.
Deixe-me agora descrever o que vi, adorada amiga. Entenda, eu estava curiosa para saber o que viria a ocorrer daqui há alguns pequenos seculos. E eu o fiz. Após exaustivos 10 minutos de uma vertigem nada agradável, encontrei-me no ano de 2541. Nao sabe voce, Jane, o quanto privilegiada és por não ter me acompanhado em tamanha desventura. Eu, nascida em 1841, em uma época onde todas as coisas simples e sensatas ainda corroem as veias da civilização humana, deparei-me com o mais angustiante momento de decadencia de minha especie. Tamanha angustia, aquela que envenenava minhas dolorosas artérias, que por um bom tempo temi que viesse a enlouquecer. Tantos acontecimentos digno de minha completa eloquencia e falta de sensibilidade, que agora ja nao ouço mais o ruir de minhas emoções: perderam-se naquele - que Deus me perdoe - inferno!
Oh Jane, eu vi com meus proprios olhos, criaturas estranhas em nosso planeta. Essas criaturas, possuidoras de olhos grandes e corpos magros e esguios, tambem aparentavam uma cor alarmante: uma pele escamosa de cor laranja, ou em alguns raros casos, verde. Alguns possuiam antenas como se fossem baratas, outros tinham asas, como os belos passáros que nessa terrível época, ja estão extintos. Eu imagino como deve estar sua frágil imaginação ao tentar desvendar os mistérios de minha atual descrição e me preocupo com a conclusão que acabo de ter. Temo que, em meu lugar, voce é que venha a ficar maluca. Mas por favor, peço-lhe que mantenha a calma, pois o pior ainda está por vir.

Sente-se bem ereta e preste atenção a partir deste momento, mas respire fundo e mantenha-se calma.Prometo ser o mais específica possível e não atravessar os patamares que beiram ao absurdo. Pois, veja você querida amiga, que esses estranhos possuem caracterísiticas semelhantes às nossas, embora sejam desprovidos de uma beleza aceitável. Parecem frágeis e um tanto quanto sádicos. Os malucos - ouso chamá-los assim - não me parecem confiáveis, tampouco sociáveis. Ao caminhar por essa estranha cidade - e agradecendo a Deus por nao poder ser vista - eu passei por alguns pequenos estabelecimentos comerciais nos quais haviam enormes gaiolas de ferro, fechadas com alguma especie de nova tecnologia. Oh, nao se trata de cadeados ou chaves. Trata-se de pequenas caixas metálicas, acionadas por comando de voz! Sim, Jane, isso beira a loucura! Mas bem, preste atenção, você não vai acreditar no que continha dentro de tais caixas, aprisionados como se fossem galinhas.
Nas gaiolas, havia nada a mais, nada a menos do que pessoas. Crianças, Idosos, alguns macchucados, outros com uma aparência saudável. Todos eles continham marcas em seus corpos, com números desenhados no pulso direito. Tamanha fora minha surpresa ao deparar-me com tamanha afronta! Não imaginas o estado lúgubre e depreciativo em que eu me encontrara desde entao, prezada amiga.
Mas engana-se ao deduzir que o absurdo termina por aí. Oh, sinto compaixão por você que lê tais palavras e acha que está livre de mais anedotas. Não permita a si mesma tamanho equivoco, pois estou apenas começando.
Oh Jane, eu vi crianças sendo tratadas como animais! Eu vi pessoas sendo chutadas por essas criaturas, eu vi famílias inteiras carregando pesados objetos com rodas - parecidos com as atuais carruagens - como se fossem cavalos! Eu vi, com olhos assustados e surpresos, uma miniatura daquela criatura horrorosa de pele laranja carregando uma criança loura de olhos azuis em seus braços, exatamente como fariam as damas de nossa sociedade ao segurar um felino. Eu vi, eu presenciei a tudo isso e tive de manter-me calada, absorta em minha angústia.
Oh, pobre de mim, pobre de mim. Não gosto de achar coitadismos em testemunhos que poderiam descrever a aparente hipocrisia daquele que narra sua própria desgraça com olhos penosos, mas devo admitir que ao lembrar de minhas esperanças sendo açoitadas a cada esquina por essa estranha-futura-realidade eu sinto uma enorme pena de mim mesma! Acredita pois, que tais criaturas, por serem realmente frágeis ao frio e ao sol, carregavam em seus corpos, tecidos iguais ao que revestem meus musculos? Sim, sim, querida Jane, eles usam peles de pessoas! Eles utilizam peles de pessoas, de pessoas, de pessoas! Repito, repito, repito e isso não há de entrar em minha cabeça tão facilmente. Oh, quase morro de aflição ao lembrar-me de suas mão gelatinosas e fétidas, cobertas por uma estranha luva de pele branca! Acredita-me que até as unhas eles mantém intactas? Pois, pelo que entendi, esta seria a "moda" do momento.
Oh, como poderão existir tamanhos bárbaros no futuro? Não compreendo o que o homem pode ter feito para que sua espécie tenha sido tão afrontada, tão rebaixada!
Mas aqui, em 2541, é tudo aceito como se fosse normal. E eu temo por isso! Oh, como eu temo...
Eu gostaria de poder finalizar essa carta depois do relato das peles, mas seria hipocrisia de minha parte ignorar os fatos que tento ocultar de minha alma, e da sua por saber a tamanha desgraça que irá causar-lhe, assim como causou a mim, mas sinto que é de extrema importância que ignore meus temores e lhe diga logo o que de mais cruel é feito com as criaturas de nossa espécie. Jane, nós viramos comida. Há aqui, prédios enormes com salas lotadas de seres humanos que são - como eles chamam - abatidos. Pelo o que o meu cansado cérebro entendeu, essas criaturas aprisionam as pessoas e, dependendo de sua cor, tamanho e idade, subdividem em categorias. Depois de subdivididas, cada qual de acordo com suas características, morrem. Oh, não, não morrem com alguma epidemia ou espada. Eles morrem a grotescos golpes, ou quando são bebês, por máquinas. Então são embalados e levados ao comércio. E então, os humanos sao postos em lugares que parecem como uma feira gigante protegida por concreto, com placas que indicam seu preço de acordo com o quilo da sua carne ou idade.
Tamanha memória é demasiado triste para mim,mas precisava contar isso a alguém, antes que explodissem dentro de meu peito! Crianças, querida Jane, crianças!
Como podem? Tratam-nos como animais... Não! Por que não tratamos aos animais assim. Eles nos tratam como lixo, como se servíssimos apenas para seu uso.
Mas apesar de tudo, algumas poucas criaturas parecem não serem aptas de tal regime e lutam pela liberdade de nossa espécie. Infelizmente, essa é uma pequena minoria quando comparada à enorme massa de sádicos, estranhos carnívoros.

Agora sim, minha querida amiga, eu termino esse triste e angustiante relato. Por favor, não pense que isso faça parte de minha mais criativa imaginação. Asseguro-lhe por tudo que há de mais sagrado nesse mundo de que lhe digo a verdade. Em breve, a espécie humana irá sofrer os tipos mais atrozes de sofrimento e não haverá nada que poderemos fazer para mudar isso. Agradeço a Deus por estar vivendo em uma época ainda pacífica.

Mais uma vez, peço-lhe perdão por tirar sua tranquilidade e talvez ter aniquilado suas próximas quinze noites de sono, mas tente se consolar com o que eu acabara de dizer sobre termos o privilégio de termos nascido no século XVIII. Espero encontrar-lhe em breve.

Com tristeza e carinho, Danielle Bennet.

domingo, 3 de abril de 2011

A viuvinha - Jose de Alencar

Nos primeiros dias que se seguiram a catástrofe, Carolina ficou sepultada nessa letargia da dor, espécie de idiotismo pungente, em que se sofre, mas sem consciência do sofrimento.

Dona Maria e o sr.Almeida, que a desgraca tinha feito amigo dedicado da família, tentaram debalde arrancar a moca desse torpor e sonolência moral. O golpe fora terrível; aquela alma inocente e virgem, bafejada pela felicidade, sentira tão forte comoção que perdera a sensibilidade.

O tempo dissipou esse letargo. A consciência acordou e mediu todo o alcance da perda irreparável. Sentiu então a dor em toda a sua plenitude e a profunda apatia sucedeu uma irritação violenta. O desespero penetrou muitas vezes e assolou esse coração jovem.

Mas a dor, a enfermidade da alma, como a febre, a enfermidade do corpo, quando nao mata nos seus acessos, acalma-se. O sofrimento, em Carolina, depois de ater torturado muito, passou do estado agudo ao estado crônico.

Vieram então as lagrimas, as tristes e longas meditações, em que o espírito evoca uma e mil vezes a lembrança da desgraca, como uma tenta que mede a profundeza da chaga, em que se acha um prazer acerbo no magoar das feridas que se abrem de novo.

A pouco e pouco o que havia de amargo nessas recordações se foi adoçando: as lagrimas correram mais suaves; o seio, que o soluço arquejava, arfou brandamente a suspirar. E, como no céu pardo de uma noite escura surge uma estrela que doura o azul, a saudade nasceu n'alma de Carolina e derramou a sua doce luz sobre aquela tristeza.

Tinha decorrido um ano.

Começou a viver dentro do seu coração, com as reminiscências do seu amor, como uma sombra que se sentava a seu lado, que lhe murmurava ao seu ouvido palavras sempre repetidas e sempre novas. Sonhava no passado; diferente nisso das outras mocas, que sonham no futuro.

Mas um coração de 15 anos é um tirano a que não ha resistir; e Carolina não contara com ele.Quando uma planta delicada nasce entre a sarça, muitas vezes o fogo queima-lhe a rama e o hastil ; ela desaparece, mas não morre, que a raiz vive na terra; e as primeiras águas brota e pulula com toda a forca de vegetação que incubara no tempo de sua mutilação. O coração de Carolina fez como a planta. Apenas aberto, a desgraca cerrara; mas veio a calma e ele tornou a abrir-se. A principio bastou-lhe saudade para enche-lo; depois desejou mais, desejou tudo. Tinha sede e amor; e não se ama uma sombra.


 

sábado, 2 de abril de 2011

Abstraindo-se

Você já parou pra pensar em como as estrelas conseguem ser tão belas e brilhantes ao mesmo tempo? Já se imaginou segurando aquele imenso poder em suas mãos? Ou, para deixar isso ser um completo paradoxo, tocar aqueles distantes, minúsculos resquícios de luminosidade? São tão belas, tão enigmáticas. Brilham para nos como se quisessem dizer algo em especial. Mas o que seria?

Você ja parou para encarar a chuva em uma noite de verão? Já ficou por uns 5 minutos olhando pra cima, enquanto aquelas minúsculas gotas vinham em sua direção, como pedaços de estrelas caindo sobre seu rosto? Por acaso se perguntou do por que de estar ali, quando o mundo supostamente gira enquanto a câmera lenta simplesmente fecha um "close" perfeito na chuva tocando seu rosto?

Você já tocou escutou uma musica tão linda e tão indiscutivelmente apropriada para o momento, que nao resistiu a decorar, ouvir, reouvir, compartilhar e dancar por milhoes de incansaveis vezes? Ja parou pra prestar atencao em cada diferente som por tras da voz da vocalista? Ja prestou atencao exclusivamente na voz da dita cuja?

Voce ja parou para sentir o cheiro das folhas de um livro novo? Ja foi a uma biblioteca e se sentiu tao confortavel como se estivesse em casa? Ja gastou seu ultimo, misero centavo em livros baratos e ignorados pela maioria?

Voce ja parou para brincar de teatro consigo mesmo, imaginando falas e movimentos friamente calculados apenas para treinar uma futura acao? Ja decorou falas de seus filmes favoritos e repetiu essas falas ao ver o filme, imitando a entonacao de voz e a expressao do ator no momento em que elas sao ditas? Ja se imaginou caminhando pelo tapete vermelho e indo em direcao ao oscar?

Voce ja se sentiu extremamente feliz, mas ao mesmo tempo extremamente triste? Ja sentiu amor e odio ao mesmo tempo? Ja se sentiu extremamente bonito, mas completamente estranho? Ja tentou arrumar o cabelo de um modo que ficasse mais aceitavel pra sociedade, quando na verdade, preferia deixar do jeito maluco e rebelde que estava antes?

Voce ja sonhou que estava caindo de um precipicio? Ja sonhou que voava? Ja teve pesadelos com o seu vizinho mutante? Ja sonhou com seu amor platonico em um mundo confuso onde borboletas falam e plantas dancam I.M.C.A.?

Voce ja fez alguem sorrir e se sentiu feliz por isso? Ja fez alguem chorar e se sentiu pessimo? Ja deu um susto e riu da vitima? Ja deu um soco e pediu desculpas? Ja puxou o cabelo e saiu correndo? Ja quebrou um espelho e comecou a chorar de arrependimento?

Voce ja chorou por alguem que merecia e depois se arrependeu? Ja chorou por alguem que nao merecia e ainda nao se arrependeu? Ja sorriu por causa de alguem? Ja bateu em alguem por causa de outro alguem? Ja ficou acordado ate tarde apenas pra falar mais um pouquinho com alguem? Ja correu por alguem? Ja fugiu por causa de alguem?

Voce ja parou pra pensar em como o tempo corre e depois se sentiu parado? Ja ficou parado e parou pra pensar em como o tempo corre? Ja olhou para o ceu e pensou que o planeta estava girando mais rapido por causa do movimento das nuvens? Ja observou o trabalho das formigas no verao? Ja observou o trabalho das pessoas no inverno? Ja matou uma mosca e se arrependeu? Ja fez cocegas na barriga do seu cachorro?

Voce ja colou na escola? Ja foi repreendido pelo professor? Ja foi injusticado pelo diretor? Ja foi acusador de um colega? Ja quebrou a perna? Ja torceu um pe? Ja queimou o proprio cabelo? Ja quebrou o oculos? Ja perdeu seu oculos no banheiro? Ja defendeu um desconhecido? Ja roubou um livro?

Voce ja quis voltar no tempo? Ja quis avancar no tempo? Ja quebrou algo por ter muita raiva? Ja chorou por besteira? Ja gritou por besteira? Ja agrediu alguem por besteira? Ja amou alguem por besteira? Ja recebeu um castigo por besteira?

Voce se questiona? Se conhece? Se importa com algo alem de si mesmo? Ja fez uma boa acao hoje? Ja estudou? Ja leu? Ja jogou? Ja caminhou? Ja comeu um doce? Ja comeu um salgado? Ja comeu um doce e um salgado misturados? Ja queimou a lingua com algo quente? Ja disse que odeia alguem? Ja disse que ama alguem? Ja elogiou alguem? Ja ofendeu alguem? Ja pensou em alguem?

Eu provavelmente sei as minhas respostas sobre essas e muitas outras questoes.

E voce? Ja se questionou hoje?

sexta-feira, 1 de abril de 2011

1 de Abril

Eu queria poder dizer que o texto a seguir se trata sobre alguma grande piada. Eu realmente gostaria de alegar que tudo que eu escreverei será obra de uma pequena e ilustre mentira. Ah, como eu queria. Mas as vezes, as coisas não são como a gente quer. Eu queria também, que o meu computador voltasse a vida pra que eu pudesse salvar esse texto sem postar em um site publico, onde muitas (quem?) pessoas poderão ler.

Eu não quero parecer ingrata ou ambiciosa, mas a verdade e que eu sinto falta. Sinto falta de coisas que nunca tive ou de pessoas que não conheci. Eu sinto falta de coisas que já aconteceram, de pessoas que já me conheceram, de algo que eu li ou vi. Simplesmente sinto falta.

Aristóteles disse: "A coisa mais difícil de ser concebida pelo homem, é o ato de destruir seus velhos hábitos". Oh sim, ele estava com toda a razão.

Quando eu paro e penso, me enxergo numa bolha gigante. Parece que eu estou plastificada, segura, dentro de um mundo distante dos outros. Sinto como se a frágil espessura da bolha estivesse se aproximando cada vez mais rapidamente daquela cruel agulha que me espera no fim da montanha. A montanha que eu tanto quis subir. Basta o mínimo empurrãozinho para que eu caia e ela se desfaça em pedacinhos.

E se eu acordar, talvez as coisas voltem ao normal. Mas dai eu me pergunto: O que seria "Voltar ao normal"? Seria voltar aquela antiga vida ou continuar na atual? Será que eu sentiria falta da atual, caso voltasse e modificasse a antiga? E se eu ficar na atual e modifica-la, ainda irei me perguntar sobre a suposta modificação da antiga? E se...Não. Suposições jamais saciarão minhas perguntas. Apenas irão agravar ainda mais a sede de uma sabedoria impossível, utópica.

Então por que, meu bom Deus, eu perco tanto tempo pensando nisso? Envolta numa nevoa gigante de duvidas, receios e suposições, eu tento encontrar a melhor forma de ser o agora e assassinar o antes. Melhor do que isso, esquartejar o " e se " e tentar sobreviver aquele avalanche de questões não respondidas.

Hoje, no dia da piada, eu estou com uma seriedade fora do normal para meu humor. Sem mentiras, a verdade parece palpitar a cada batida do meu coração, confusa e um tanto que insegura enquanto treme nas minhas mentiras. Não que eu seja mentirosa, longe disso. Ao menos não para os outros. Eu gosto de acreditar naquilo que me parece mais aceitável de ser acreditado. Pelo menos em relação a alguns assuntos. Assim como uma criança se faz acreditar que o remédio com gosto ruim sempre será o melhor para sua saúde, eu me faço acreditar que o caminho supostamente correto é o único pelo qual eu devo seguir. Honestamente, eu já nem me importo mais se for chamada de hipócrita, por que talvez eu seja definida exatamente por essa palavra. Hipócrita.

Um pouco de auto-hipocrisia para terminar o dia, acompanhada de um copo de refrigerante sem gás e de uma iluminação exagerada da tela do computador.

Os olhos ardendo em chamas de cansaço, os dedos febris e enérgicos. O cérebro confuso, imutável. É nesse estado que eu descrevo minha hipocrisia. É assim que eu fecho o meu dia.

O dia da piada?

Não. O dia da mentira.

E não ha nada de engraçado nisso.