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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Pausa para o Suicídio

Tenho me visto como uma coisinha errada, um rabisco que se faz por engano na pontinha não usada da folha de caderno. Sou um emaranhado de nós, quase como aquelas pinturas que dizem ser arte abstrata. Eu sou o abstratismo em pessoa! E acabei de inventar essa palavra, a propósito, o "abstratismo".

Tenho me sentido tão poderosa como dona de um blog que já me vejo no direito de criar novas palavras. Sim, quatro anos de blog e somente agora começo a sentir certo orgulho nisso. Não que seja lido, não que eu espere reconhecimento, não que eu conte as visitas. Só acho digno ter esse direito.

Tenho me visto como um rabisco errado. Algo feito de forma totalmente involuntária, que não se espera, não se planeja, não se pede. Algo que surge do meio do nada só pra fixar existência, ganhar um número de fabricação, produzir mão de obra, carregar algumas bagagens emocionais e dar o fora. Tipo isso.

Tenho sido uma coisinha tão pequena que quase me sinto insignificante. Mas daí lembro que o Robert Pattison (sim, aquele lindo do Crepúsculo), disse num filme que um tal de Dalai Lama (algum desses budistas carecas com cara de papai noel) disse (to sendo muito repetitiva?) que não fará diferença nenhuma o que fizermos no mundo, mas é muito importante que façamos.

Sei lá, esse tipo de frase chega a me dar arrepios, chega a dar cambalhotas no meu estomago. Então, quando me sinto insignificante e pequena, lembro do tal do Dalai Lama. Lembro dos caras grandes que um dia foram pequenos. Lembro do Stephen Hawking na sua cadeira de rodas. Lembro da J.K. Rowlling viajando num trem londrino e vendo o Harry Potter. Lembro de Jesus. Viro religiosa, filósofa, exemplar. Até pensei em dar palestras esses dias. Ou seria "esses dias, até pensei em dar palestras"?

É isso, me sinto pequena de novo. To perdendo o jeito, não sirvo mais pra escrever. To me aposentando. Tchau aí galera, não sirvo mais. To velha. To pobre. Sei la, alguma coisa eu to. Fico falando frases de crepúsculo. Ontem me peguei vendo novela. Tenho aprendido a cozinhar. Aposentei minhas revoltas. Tchau aí, foi um prazer conhecer vocês. Não conversem com estranhos, sigam pela sombra. Olha, ta dando lagoa azul de novo.

Não é meio louco como o Stan Lee criou todos aqueles caras em roupas coloridas e frases de impacto? Ainda estou apaixonada pelo homem-aranha. Sério, um dia caso com aquele homem. Acho o máximo tudo isso de um grande poder trazer uma grande responsabilidade e tal. Queria ter nascido num gibi. Daí começo a me perguntar se será possível que os personagens tenham uma alma. Mas então, talvez, os atores tenham milhares de almas. E se o Tobey Maguire, no fundo, ainda tiver a alma de homem-aranha? Caso com ele. Sério.

Criar um personagem dever ser tipo ter um filho. Tipo ser Deus. Que pena que não vou descobrir, to me aposentando. Tchau aí, tudo de bom pra vocês, to caindo fora. Não dá mais, é muito pra mim. Essa coisa de ser escritora. Vai ver que é tudo um engano meu. Acho que nasci pra morrer que nem todo mundo. Não que Stephen Hawking não vá morrer, mas o cara nasceu pra mudar o mundo. Eu nasci pra que mesmo? Procriar? Desculpa aí Igreja, mas to fora.

Eu deveria ser bilionária que nem naquela música do Bruno Mars. Sim, por que agora eu escuto Bruno Mars. Quem liga pra droga da cultura de peso? To tentando fazer parte desse país de terceiro mundo, me deixem em paz. Desisto de ser escritora, deixa que a Lispector já fez melhor por mim. Deixa que as americanas com um ensino e oportunidades melhores já estão fazendo meu tão sonhado trabalho.

I wanna be a billionaire...

Tchau aí pra vocês, foi ótimo e tal, mas to me aposentando.

Claro que dessa vez não é uma crise, ta na cara que eu não presto mais. Eu sou um boizinho que nem todo mundo. Muu pra vocês. To feliz como gado. Sério mesmo, no problem. Adoro essa coisa de falar inglês e parecer minimamente com o lindo do Bruno Mars que eu nem acho lindo mas digo que é só pra poder me enturmar "cázamiga".

Tchau aí, amo vocês seus lindos ( não é que eu aprendo rápido a me enturmar??)


 

Comunicado Importante

Hoje pensei em escrever um livro. Nele teria uma personagem que eu não lembro muito bem, mas acho que era divertida. Uma garota engraçada, apaixonada por seu cachorro ruivo que também era desdentado. Não que a menina fosse desdentada, mas ela tinha uns dentes bem estranhos. Um cara certo e baixinho. Um cara errado e musculoso. Um gato gordo com problemas intestinais. E um quadro pintado à mão do Beatles que se perderia no meio da redenção enquanto a tal menina engraçada comia um acarajé e sorria de um modo deprimente para o cara errado. Londres, Nova York, Romênia e Porto Alegre são as cidades principais do enredo. Acho que o nome dela seria Dorothéia. Daí mudei depois pra Anna. Imaginei que alguém podia ter um super-poder inédito. Não faço ideia de qual era, decidi que seria segredo. E os caras, o certo e o errado, podiam ser gays. Nunca disse que eram certos ou errados pra ela. Eles eram tipo a complementação de um equilíbrio perfeito um com o outro. Algo profundo mesmo. A menina ruiva ou loira queria ser cantora. Ela cantava horas a fio no karaokê e tinha uma voz de fada quando estava calada. Sim, eu disse calada. Daí pensei que talvez ela pudesse conhecer algum vampiro sexy e romeno. Vi os dois andando de mãos dadas sob poças românticas de sangue em formato de corações. Ele se transformando num morcego e ela observando da janela enquanto ele voava em círculos em frente à lua cheia.

Desisti, seria crepúsculo demais.    

Pensei que pudesse ser erótico. Talvez o vampiro romeno e sexy pudesse ser, na verdade, apenas um personagem de um clube de strip local. Era vampiro só nas quintas à noite em uma boate de cunho duvidoso.

Desisti, seria bizarro demais.

Pensei que talvez ela também pudesse ser gay. E conhecesse uma menina linda e hetero. E o problema da vida dela fosse esse amor platônico eterno.

Mas daí desisti, por que uma história dessas não ia chamar a atenção de ninguém. E eu tenho uma confiança minúscula na minha capacidade de imaginação.

É.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A moça do Camafeu

A moça do camafeu dava seus passos largos sob as pedras ardentes do cais. O joelho doía na ferida aberta que dilacerava sua carne sensível com o atrito que a prótese causava na pele. O suor derramava-se imponente por entre os vincos do sangue seco. Tinha dentro de si uma morte pela qual chorar, mas não se lembrava ao certo de qual defunto seria. A dor nas pernas a impedia de esquecer-se de sua condição limitadora: não podia caminhar demais. Caminhe pouco, era o que todo o resto dizia.

E tinha sido exatamente assim desde aquele dia quente de dezembro passado. Desde aquele acidente que levara um terço de sua perna pra fora do mundo. Não que devesse ser uma historia triste sobre perdas de membros, mas achei que talvez fizesse certa diferença na percepção alheia o adicionamento de mais detalhes explicativos. A moça do camafeu era jovem e apaixonada, não tinha tempo pra sentir dor nas pernas ou reclamar de feridas que se curam lentamente. Não tinha tempo para sofrer e, por isso, era inexperiente na arte da dor. Mas tinha certo conhecimento em matéria de perda.

Dentro de si, guardava sopros irreconhecíveis de uma vida que nunca teria. Queria ter pernas bonitas. Queria ter o cabelo longo e saber falar todas as línguas do mundo, exceto japonês: gostava de alimentar certos mistérios. Queria ter mil olhos, pra poder ler quinhentos livros ao mesmo tempo. Queria ser lendária, mitológica, imortal, vampira, professora, azul. Simples assim, ela queria ser azul.

A moça do camafeu dava seus passos largos sob as pedras ardentes do cais do porto. O guarda simpático lhe acenava um tchau. Ele sorria, seus olhos cansados. Talvez ele me reconheça, pensou ela, embora não tivesse a mínima fé nisso. Talvez ele saiba por que me sinto triste. Talvez possa me ajudar a encontrar o velório. E, de logo, achou-se uma tonta. Que diabos o guarda poderia saber da vida? Nada, nada. Era só um homem feliz, casado, com filhos. Talvez fosse pirata, talvez fosse gay. E se não tivesse filhos? Poderia ser infeliz. E se não tivesse mãos? Ou pernas?

Ela já não duvidava de nada. Aprendera a não confiar nos próprios olhos, esses fofoqueiros mentirosos e superficiais. Sempre nos enganando com suas imagens ao pé da letra. Olhos são os órgãos mais belos e mais burros que o ser humano carrega. São traiçoeiros e mentirosos, um perigo quando mal usados. Ela tinha aprendido a controlar os seus olhos e nunca acreditar no que eles diziam. Ela nunca mais seria passada pra trás, ah não mesmo.

A moça do camafeu doía, ela toda. Como uma ferida aberta ambulante sem cicatrizante algum pra ajudar na reposição do tecido morto. Ela morria lentamente e queria chorar, mas não sabia pelo quê. Fantasmas a cutucavam pelos lados, faziam cócegas em seu nariz, ventavam em suas têmporas. Sussurros a faziam ter calafrios. Apenas um casal jovem a fazia companhia e ela se sentiu total e ridicularmente sozinha, quase como uma intrusa. Ela era a figurante estúpida que se intrometera na tomada errada, na historia errada, na paisagem errada, no momento errado. Toda equivocada, deu seus passos doloridos pelas pedras quentes.

O pé queimava por dentro do tênis surrado, a pele arranhava em carne viva a cada passo, mas ela quase não sentia. Era como se, de tanto amor, tivesse também certo torpor. Já quase não sentia dor alguma, era tudo um grande incômodo do universo, algo com o qual se aprende a conviver, uma pedrinha no sapato que se caminha sem notar quando o costume se torna maior do que o incômodo.

A moça do camafeu estava perdida, louca, triste e de luto. De luto pelo quê? Não fazia ideia, mas sentia saudade. De tudo, de nada, do todo, talvez. Não fazia ideia. Corria sob o sol fervoroso de dezembro, procurando por certa lógica na insanidade. Procurando por certo lugar no vazio. Fazia desejos desconexos para o universo, um Deus que não conhecia.

O senhor de longe a observava com certa adoração: era uma jovem adorável aquela, pensava ele. O senhor de perto se divertia: era jovem e queria só dar alguns beijinhos na namorada sem ser incomodado, mas achava certa graça da moça que se despedaçava ao vento bem abaixo de seus olhos. Carregava com ela, por sob o colo, uma joia rara. Pedras azuis emolduravam o retrato de uma moça no século XVIII. O rapaz não fazia ideia de nada disso, mas achou certa graciosidade no modo como aquela velharia contrastava tão bem com a jovem espevitada.

A moça do camafeu olhava ao longe do Guaíba com olhos felizes e um sorriso triste. Ou talvez fossem olhos tristes e um sorriso feliz. Não saberia dizer, não a via. Estava absorto eu meu estudo de feições, minha busca por personagens. Ela, com certeza, daria uma ótima personagem, percebi eu. Com suas mechas azuis a flutuar por entre as chiquinhas castanhas. Era um descompasso, um anacronismo. Parecia saída de outra época, de outro mundo, de outra idade. O rosto juvenil carregava em si um olhar ancião. Um olhar de quem já morreu e já sabe como é morrer. De quem já perdeu um filho, talvez. De quem já amou e foi embora. De quem já viu a fome e ainda assim não tenha ideia de como é se estar faminto.

Então, como que lembrando-se de algo em meio aos seus desatinos longínquos, a moça do camafeu direcionou-se lentamente pela saída, com as cabeça baixa e o pote de sorvete colorido por entre os dedos melados. Não via seu rosto, mas me parecia de costas que estava satisfeita com algo, talvez com a tristeza. Parecia triste e, ainda assim, paradoxalmente feliz. Era o retrato da filha que a alegria e a morbidez tiveram.

A moça do camafeu sentia-se triste, mas não era esse o sentimento padrão de todo o ser-humano com o mínimo de autoconsciência? Sentia-se triste quase como se pudesse chorar. Quase como se pudesse sentir falta de algo que ainda não reconhecia como seu. E, paralelamente, sentia-se alegre. Totalmente feliz. Como os ventos anunciadores da chuva que viria em breve. Como um aviso cósmico sobre as bem aventuranças próximas. Como um contraste bonito para se iniciar um recomeço.

A moça do camafeu não sou eu. É o meu alter ego, tentando desenhar a si mesmo como um personagem decente. É o meu subconsciente escrevendo sobre seu consciente. Um quê de esquizofrenia aqui, um quê de narcisismo ali e estamos bem. Não me reconheço como moça no alto de meus x anos, mas gosto dela. A moça que observa a tristeza com certa alegria. Gosto dela. Essa saudade do que não conheço, do que nunca possuí. Tenho certa inveja de sua falta de razoabilidade. Tenho certo sentimento por nossas semelhanças.

A moça do camafeu foi embora, carregando consigo meus tormentos e minhas curiosidades. No íntimo, as lágrimas que não caíram, os sorrisos que não provoquei.

Amei-a.

Fui-a.

Descrevi-a.

E, como a boa amadora que sou, transformei-a em texto, só pra não ficar a assombrar-me pela memória.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Desabafo Indecente

Devo ter algum problema grave de fabricação gravada no íntimo dos íntimos de dentro das minhas partículas de átomos danificados nas milhões de zilhões de células que me fazem ser quem eu sou. Sério. Sem querer blasfemar, mas acho que Deus teve um grande descuido trágico enquanto me soprava por dentro do nariz de barro. Tenho certeza que alguma parte do meu risco rígido de memória RAM está muito danificado, tipo muito mesmo. Sabe? Como um cavalo de Tróia permanente ou algo assim. Como quando cai um fio de cabelo dentro da panela e a gente não sabe mais como tirar e só se da conta depois que ta comendo e encontra o dito fio dentro da boca. Tipo algo irreversível, intransigível, indissolúvel. Com uma consequência certeira no final do destino errado. Tipo comer um macarrão maravilhoso com um molho divino e ser incomodada pelo mesmo fio de cabelo logo quando o alimento estava sendo dissolvido com seu devido prazer.

Quer algo mais broxante do que fio de cabelo no meio da massa?

Acho que só cueca de bichinhos. Sério.

Não, não me refiro a minha miopia, ao meu estigmatismo ou aos meus dentes tortos. Tampouco reclamo dos meus dois pés esquerdos ou dos meus olhos separados. Tem também esse redemoinho esquisito no topo frontal da cabeça que aborta todas as minhas tentativas de uma franja perfeita. Ah, claro, tem também a minha alergia a ácaro e a minha bronquite aguda e a minha teimosia e falta de responsabilidade momentânea. Mas não, não é nada disso. Meu problema central vai além de qualquer defeito meramente ilustrativo, físico ou psicológico. E é tão, mas tão vergonhoso que eu nem sei ao certo sobre como devo escrever sobre isso. É um daqueles assuntos constrangedores, tipo quando a gente vê a nossa mãe de lingerie se achando a Madonna. Acreditem, eu já passei por isso. Tão constrangedor quanto deixar aquele estrangeiro bonitinho escorregar a mão pro lugar certo quando a porta está relativamente aberta no lugar errado e alguém presumidamente estúpido acaba vendo.

Senhoras e senhores, tirem as crianças da sala, pois a coisa agora vai ficar feia. Preparem seus corações, respirem fundo, deem as mãos, pensem em Jesus e torçam pra que eu encontre a luz divina depois dessa revelação, por que o que virá a seguir será chocante, terrível, estrondoso, constragedorreríssimo: Eu sou um buraco sem fundo. É, tipo um daqueles funis que se usa na cozinha pra coar as coisas sabe? Bem assim. Eu sou insaciável, insatisfeita, horrorosa. Tipo uma fome que nunca se acaba, uma preguiça que nunca se finda, um beijo que se prolonga. Tipo algo incomum. Tipo anormal. É isso. Eu sou tipo um funil, uma pessoa anormal. Não tem chegada, não tem fundo, não tem chão, não tem gravidade. Não tem porra nenhuma na verdade. E, do fundo do coração, não queria mesmo que a ultima frase rimasse.

Já tentei falar isso pro meu psicanalista e ele disse que o ser humano nunca está satisfeito e isso é normal. E vamos combinar que essa é a porcaria de frase mais clichê e estúpida de todos os tempos. Quer dizer, se eu matasse alguém o cara simplesmente poderia então dizer que a minha violência é normal por que é coisa do ser humano ter um pouco de filha putice dentro de si, certo?

Daí eu contei pra minha melhor amiga. Por que é isso que uma mulher estressada e louca de desejos insanos faz quando não sabe quem mais poderia entendê-la se não aquela outra mulher estressada e cheia de desejos insanos que deveria ser a sua irmã: ela conta tudinho e espera ser entendida, ou, no mínimo, reconfortada. Vã ilusão. Minha melhor amiga é tão macho e tão mais problemática e tão mais prática do que eu, que me bateu forte no ombro e disse "Deixa de ser mulherzinha".

Então eu, já desesperada, tentei contar pra minha mãe, por que, no final das contas, só quem passou oito horas num trabalho de parto horrível pra abrir a vagina em mil vezes maior do que o tamanho normal pra te deixar entrar nessa bosta de mundo deveria saber o melhor a dizer numa hora dessas. Que tolice a minha! Ela fez biscoitos, passou a mão no meu cabelo e perguntou, com um sorriso ansioso, se eu achava que aquele novo corte de cabelo horrível estava parecido com o da Katy Perry. E o que eu fiz? Eu disse que sim. Não é como se eu pudesse falar que minha mãe parecia mais com uma união bizarra entre uma daquelas galinhas de briga que se põe nos ringues ilegais e ficam com a crista toda fudida e a tentativa falida da Miley Cyrus em parecer minimamente mais malvada com aquele cabelinho curto e descolorido do que com a eterna Hanna Maconha.

Montanha.

Montana.

Tanto faz.

A gente simplesmente não pode dizer uma coisa dessas. É tipo quebrar um dos protocolos principais estabelecidos na história da paz mundial na relação de mães e filhas. E como eu sou uma mulher muito digna, fiel aos protocolos de mães e filhas e extremamente compreensiva com essa paixão feminina em estragar o cabelo pra tentar disfarçar a solidão, menti.

A questão é que ninguém, ninguém mesmo me ouviu. Tentei até falar com as paredes como diz aquela música cafona. Mas eu tô pouco ligando se elas me ouviram. Por que paredes não nos abraçam ou dizem que somos mais bonitas do que a tal da Megan Fox como somente um bom amigo gay faria. Não. Elas ficam ali, perdidas nos seus tons pastéis, como se não tivéssemos dito nada. Que ganho eu posso ter em falar com paredes quando elas não me respondem? Então nem mesmo a parede pôde saber quais são meus desejos insanos.

Daí eu lembrei de algo crucial nessa minha vida: o meu netbook. Que instrumento mais maravilhoso! Claro, claro. Eu tenho um blog! O lugar mais maravilhoso do mundo, do planeta, do continente, do universo, da galáxia, da existência estrelar dos jedis da sessão interplanetária inimaginável. Simples assim. O meu blog é o lugar mais foda de se falar com alguém. So, here am i (então, aqui estou eu). Bilíngue e tudo. Mas só por que eu amo vocês. E só por que ninguém mais vai me entender.

Sou uma louca insaciável. Até aí tudo bem, acho que vocês já entenderam. Mas e como funciona quando a gente quer mais de um? Sabe... Mais de um. Tipo quando tu tem um carro e quer ter outro. Não que teu carro não te faça feliz. Não que teu carro não te satisfaça. Não que teu carro não seja grande e veloz e potente e másculo e tenha mãos fortes, digo, rodas. Rodas fortes. Mas é que daí te dá uma pontinha de vontade de voltar a experimentar o carro velho, só pra dar uma voltinha fora do comum. Só pra ver se continua bom. Carros. Sim, eu sou uma maníaca, louca, compulsiva por carros. E a questão é que vivo morrendo de vontade de experimentar outros carros. Claro que eu tenho um carro bem potente na garagem, mas não pode ter mais outros não?

Livros. Amo livros. Amo, amo, amo. Todos eles, amo todos. Eu poderia citar dezenas e dezenas com a frase "esse é meu preferido" do lado e iria ser verdade. Por que não pode ser assim com carros? Eu quero carros. Mulheres, vocês sabem do que eu estou falando. Carros. Sabe? Outras marchas, outros pedais, outros assentos. Uma nova maciez, um ronco de motor diferente, um cheiro de climatizador diferente. Um com ar condicionado, outro com janelas grandes, outro com quatro portas, outro só com os bancos da frente. Caminhonetes, derivações, cores diferentes. É muito bizarro? Loiro, moreno, ruivo. Amarelo, preto, vermelho, azul. Quero carros. Mas ninguém compreende. Ninguém consegue. É muito bizarro? É muito promíscuo querer experimentar outras texturas, outras visões, outras peles? Queria ser mais de uma, pra andar em vários carros ao mesmo tempo.

Por quando eu estou dentro de um, penso em estar dentro de outro. E eu nem sei ao certo como explicar isso. É muito bizarro? Será que um dia ainda vou acabar como a minha mãe, com os cortes de cabelo e a adoração pela Madonna e tudo? Não que minha mãe seja uma tarada maluca por carros, mas essas coisas meio que chegam na gente junto com a genética. Mas e se minhas filhas forem assim também, então a culpada serei eu? Filhos. Como vou ter filhos com vários carros diferentes? Não fecha.

Carros e homens. Meu grande problema nessa vida. Minha ambição mais vergonhosa, promíscua, sombria e curiosa. Não que eu me ache a rainha das putas dos carros. Mas acho que no fundo, lá no meio desse montinho esquisito de carne que a gente tem nas entranhas, toda mulher é meio puta. Não tem essa de se nascer santa e virar anjo. Não gosto da palavra puta por que é meio violenta. Mas gosto da libertação que ela trás. Ser puta é questão de respeito na Farrapos noturna. E se tu não sabe o que é farrapos, vem pra Porto Alegre que eu te explico, por que é uma das ruas que exala desespero, sexo e libertação feminina.

E carros dos piores tipos.

Por que somente carros baratos apreciam boas putas farrapianas.

Putas que tem todos os carros que querem e os que não querem também por que são putas e sabem disso. Ser puta é uma condenação promíscua que liberta a puta interior da puta puritana. A mulherada do mundo tá infestada por essa nova raça, as putas puritanas. As mulheres fortes e independentes que se divertem com os próprios dedos por uma falta de coragem absurda em se aceitarem como putas. E não digo isso como uma ofensa, mas sim como algo digno, uma característica comum no sexo feminino. O putismo. Libertem-se mulheres, libertem as putas que há em vocês. Sem puritanismos ou hipocrisias ou classe ou beijinhos ensaiados. Sem lençóis manchados do próprio batom. Chega de ser auto-suficiente. Sejamos putas. Sejamos verdadeiras. Sejamos mulheres de fibra com algo a oferecer pra esse mundo.

Putas sem vergonhas e corajosas do universo: Uni-vos!