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quinta-feira, 24 de julho de 2014

Romance Platônico

Sou romântica. Meu amor sufoca, minhas mão matam, minha voz é firme, comanda. Sou romântica. Não sei ficar longe, tenho medo de distância, desacredito na verdade, sigo as mentiras que minha paranóia conta. Sou romântica. O amor é uma ilusão, o sexo é uma distração, você é uma imagem projetada pelos meus traumas infantis. Sou romântica. Meu cobertor é frio, meus braços são longos demais, minha solidão cai desapercebida por entre as frestas da monotonia. Sou romântica. Sei que o casamento é uma instituição burguesa criada para controlar a mulher e seu poder de escolha. Sei que a culpa não é das estrelas se eu sou louca e inconstante. Sei que o amor não dura. Sou romântica. Não imagino você em vinte anos segurando minha mão. Não imagino filhos que se chamem de nomes engraçados. Não imagino um amanhã em sépia com nossos olhos brilhando. Sou romântica. Acredito em homem agressivo, homem machista, homem que não teve tempo de virar homem ainda, homem que machuca, que submete, que não liga. Sou romântica. Sou ativista do mundo, quero ajudar os outros a enxergar com olhos mais experientes, quero salvar os animais que são assassinados, quero dar alegria às crianças que sofrem, quero acabar com a vida não sustentável, quero dizer que o amor é uma paródia da nossa simulação de convivência. Sou romântica. Por isso vou acabar sozinha e infeliz. Por isso vou sofrer em Paris. Por isso vou escrever, lutar, amar e nunca ser compreendida. Por isso escrevo esse texto. Por que sou romântica e o romance não é permitido nesse mundo sem esperança.

domingo, 6 de julho de 2014

Onde está o amor?

Seis horas da manhã. O mundo começa a girar, o sol brilha no horizonte, ilumina minha casa pelas frestas sujas. Os carros vem e vão, ônibus fazem barulho, caminhões correm descompromissadamente. Você veste seu uniforme numérico e segue para o abate, para a designação dada em nome da sobrevivência. Os bancos faturam, produzem dinheiro. Você continua em frente, suas ações pré-programadas nas suas cinco horas de sono muito mal dormidas. Somos privilegiados, eles dizem. Somos privilegiados por uma vida cheia de compromissos e batalhas diárias. Uma universidade garantida no currículo, um trabalho com salário garantido no final do mês. Passamos uns pelos outros todos os dias de nossas vidas, não damos importância a isso. Deixemos que se calem, que se matem, que se sumam. O amor foi corrompido pela individualidade suprema. Você não quer me ver, não quer me dar bom dia, não quer ser meu amigo. você não quer saber quais são os meus medos, quais são as minhas batalhas, quais são as minhas alegrias. Você não se pergunta se eu tenho alergia a cebola, se eu gosto de comer língua de boi nos domingos, se eu assisto aos jogos da copa e apito vuvuzelas pelas ruas. Você não quer conhecer minha tatuagem, não quer viajar comigo para a Patagônia, não quer se meter com uma estranha. O amor foi assassinado. Estamos em estado de emergência. Eu não quero fazer amigos, não quero saber se você é de esquerda, não quero parar a minha caminhada apressada para dizer olá. Tem um peso nas nossas costas, um peso morto carregado pelo nosso ombro coletivo. Isso nos impede de ver o pôr-do-sol, de amar sem medo, de ficar de porre numa segunda-feira. você se junta com seus colegas da sociologia para fumar na grama do Parcão, você se junta com seus conhecidos da escola para beber na Padre Chagas, você marca um evento na Casa de Cultura Mário Quintana apenas para lembrar que ainda é criança. Você vai ao parque Tupã, gira de cabeça para baixo para sentir a pressão da morte no cérebro, gira de cabeça para cima para tentar lembrar a alma de como deve ser estar vivo. O amor escorre pelas nossas tentativas de dar adeus. Nós caminhamos por aí, com pressa. Não admiramos as árvores, as ruas bonitas. Não escutamos os batimentos cardíacos dos pássaros, não escrevemos poesias, não tiramos fotos, estamos desacostumados a eternizar o banal. A Idade Média que não tinha internet, nem whatsapp, nem facebook, já está muito ultrapassada com suas pinturas a base de óleo. Você não precisa disso. Você desaprendeu o que é o amor. E você acha que está tudo bem assim.